Família

Evangelho de Marcos 3,20-35

Este Evangelho sempre mexeu muito comigo, já me indignou, quando sabia muito, sabia tanto que até considerava grosseira a forma como Jesus reage à chegada da sua mãe. Já me provocou alguma diversão quando o usam para me apontar o errado do cristianismo no culto a Maria. Hoje gosto muito dele e cada vez mais procuro lê-lo e meditá-lo "descalça"! Descalça da minha sabedoria, da minha interpretação, dos meus conceitos de certo e errado, até da minha noção de família ou de Igreja.

Hoje ao ler um artigo,  que falava de  Dietrich Bonhoeffer, ficou na minha cabeça, o facto dos condenados em Auschwitz irem nus para a forca, tal como o retirar e sortear a túnica de Cristo antes da crucificação. Tal como hoje em muitos países, regimes opressores que veêm o condenado, o preso como um objeto e do qual se aproveitava tudo, roupas, cabelos etc... E desta forma desumanizando retirava-se toda a dignidade, contudo entendo a surpresa que provocaram homens e mulheres que enfrentaram e enfrentam hoje a morte de cabeça erguida, com a certeza que pertencem à família de Deus e nenhum ser humano nos pode retirar a dignidade que daí advém...

E como dizia o Mestre Eckhart só quem  arrisque a retirar as peles, os ornamentos e se queira conhecer, só quem entre nesta aventura de se deixar encontrar por Deus, na fragilidade, na sua nudez, na sua verdade pode ser “ irmã/ irmão, pai ou mãe" de Jesus (cf 3,31-35)! Todos os “fariseus", sábios, todos os que tem as certezas e a segurança das suas verdades (cf. Mac. 3,22-30), não conseguem ser Igreja, ser Irmã e Irmão, ser o próximo do outro… Só quem se despoja… e é tão difícil… vive esta dinamica, não de uma familia que se escolhe, que se forma, mas de uma família que se aceita e que se ama… Num amor que nos leva à cruz, de ver a vida a fugir, a demencia a aumentar… e segura a mão até ao ultimo suspiro… Porque somos família!

Ir. Flávia Dores, op

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