Dia Mundial da Língua Portuguesa

Nos tempos que correm ouvimos continuamente frases como “os jovens de hoje em dia não leem”, “os jovens de hoje em dia já nem sabem escrever”. Quando paro para pensar nisto, fico triste porque efetivamente temos todos dado cada vez menos importância a algo que tem um impacto tão grande na nossa vida e especialmente na nossa história enquanto povo. 

Pensando na nossa língua, relembro os milhares de versos que já li em poemas simplesmente incríveis, nas inúmeras conversas encantadoras que tenho a oportunidade de ter com aqueles que estão à minha volta e relembro-me também das cartas que antigamente tanto se escreviam e onde, através da escrita, ficavam eternizadas memórias, momentos e sentimentos. 

Enquanto escrevo isto há um pensamento obvio que me salta à cabeça “então e isto tudo não é também possível nas outras línguas?” Claro que sim, mas todos sabemos que o povo português desde há muito tempo que traz consigo sentimentos muito próprios e onde acaba por deixar o seu toque nas palavras proferidas. 

Somos um povo carregado de sentimento, de emoção e comoção. Vivemos na nostalgia constante do que nos vai fazendo felizes e numa saudade imensa sempre insaciável. Acredito também que muito disto se deva ao quanto de nós colocamos nas coisas que fazemos e naqueles que conhecemos e, parecendo que não, tudo isto se reflete na nossa língua e, consequentemente, na nossa escrita.


Deixo então, por fim, um poema de D. José Tolentino de Mendonça que gosto muito.


E, por fim, Deus regressa
carregado de intimidade e de imprevisto
já olhado de cima pelos séculos
humilde medida de um oral silêncio
que pensámos destinado a perder

Eis que Deus sobe a escada íngreme
mil vezes por nós repetida
e se detém à espera sem nenhuma impaciência
com a brandura de um cordeiro doente

Qual de nós dois é a sombra do outro?
Mesmo se piedade alguma conservar os mapas
desceremos quase a seguir
desmedidos e vazios
como o tronco de uma árvore

O mistério está todo na infância:
é preciso que o homem siga
o que há de mais luminoso
à maneira da criança futura

 

In "A noite abre meus olhos - Poesia reunida", ed. Assírio & Alvim


Maria Sabino

Comentários

  1. Gostei desta partilha que gostei de ler, eu que gosto de ler bjs ir. isabel

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