Missão: lá fora mas cá dentro (um testemunho vocacional)!!!
Queridos leitores,
Entre 16 de setembro de 2016 (há precisamente um ano atrás) e 30 de julho de 2017 tive a oportunidade de viver um ano de missão. Qual o país para onde fui fazer voluntariado? Fui para Portugal, mais propriamente em Aveiro, na Casa das Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena, por outras palavras: fui para o Convento!
É verdade que foi um ano intenso de missão com as Irmãs, de conhecimento, e sobretudo, de discernimento vocacional. Entrei para o Convento consciente que levava mais perguntas que respostas, mais dúvidas que certezas. Mas, um ano passou, e agora?!?!?
É verdade que foi um ano intenso de missão com as Irmãs, de conhecimento, e sobretudo, de discernimento vocacional. Entrei para o Convento consciente que levava mais perguntas que respostas, mais dúvidas que certezas. Mas, um ano passou, e agora?!?!?
A dado momento da minha vida, senti que Deus me pedia algo mais. Sem saber o que Deus me pedia e com vontade de descobrir, arrisquei em perceber a Sua vontade e o que Ele quer para mim. A partir dessa decisão, foi um quase procurar as pessoas “certas” para me acompanharem. Conhecendo já as Irmãs Dominicanas e pertencendo ao VTS (Voluntariado Teresa de Saldanha) e à Pastoral Juvenil e Vocacional Dominicana, fazia todo o sentido iniciar esta Caminhada nesta Comunidade, e mais concretamente na Comunidade de Aveiro, uma Comunidade muito especial :) Quando proposta à Prioresa para viver um ano com as Irmãs, foram-me colocadas algumas “regras” como por exemplo:“Se saíres avisa, diz para onde vais. Só para o caso de te acontecer alguma coisa a gente saber”.
Muito difícil de cumprir as “regras” :) é como se fosse viver com os pais, mas no caso, com pessoas mais velhas e com uma experiência e sabedoria de vida fantástica, própria dos nossos jovens seniores :)
Viver em Comunidade e todas as “regras” que isso implica, viver a diferença, as limitações – minhas e dos outros – os gostos, as complicações do dia a dia, as preocupações, as doenças....um desafio que aceitei de livre e espontânea vontade, só assim poderia ser.
Lembro-me do nervosismo com que entrei no Convento, pois a matemática é uma ciência exata, mas as coisas de Deus....tem que se lhe diga! Porém, para além de descobrir a vontade do Amiguinho, ia estando com as Irmãs. A Comunidade de Aveiro funciona como Lar de terceira idade, mas para religiosas, no caso dominicanas. Num momento inicial, trazia as Irmãs à rua, fazia uma pequena visita às Irmãs que não podiam sair (a visita pascal, como lhe chamo :) pois era uma visita curta) e tratava da medicação. Posteriormente, fiquei só “responsável” pela medicação e pelas visitas.
Confesso, nunca tive muito jeito com idosos e só pelo simples facto de fazer “visitas pascais” me deixava com algum receio, pois não sabia o que dizer e muito menos sabia começar uma conversa pois há algumas Irmãs que têm alzheimer, que estão acamadas, que ouvem mal – próprio da idade – sim, as Irmãs são pessoas normais, também ficam/“ganham” doenças (não é por serem Freiras que deixam de ser pessoas, são humanas!).
Para além de estar com estas Irmãs do “3ºAndar”, o meu tempo passava também por ajudar a preparar atividades pastorais assim como catequeses – a minha praia :)
A nível profissional, dava aulas de música – trompa.
No meio disto tudo, “Olá Deus, sei que me conheces, mas...o que queres mesmo para mim???”
Sim, a inquietação de quem procura respostas e só encontra perguntas; a sensação de estar sempre a andar às voltas, quase nunca saindo do mesmo sítio, mas o topo da montanha estava próximo; o que é que os pais, amigos e familiares vão dizer se se vier a confirmar (que a minha vocação passará por ser religiosa); como vão reagir se na verdade nada se vier a confirmar; o que é que os outros vão dizer. Na verdade, mais do que o que os outros pensam, é o que nós pensamos. Em determinados momentos chorei, pois tive consciência que alguns amigos próximos estavam a falar de mim e sobre o meu futuro nas minhas costas em vez de me perguntarem diretamente. Por outro lado, tive amigos em que a minha escolha vocacional só me dizia respeito a mim e estavam indiferentes, pois “só quero o teu bem” e “tens o meu apoio para o que te fizer feliz”. Foi importante deixar cair a etiqueta de “o que os outros pensam de mim”, a partir daqui as coisas foram ligeiramente mais fáceis.
Mas, voltando ao viver em Comunidade, mais concretamente viver com pessoas que têm idade para serem minhas avós :) Eh pá…. Viver com estas Santas (a forma carinhosa com que eu trato as Irmãs :) ) foi brutal. Ok, no início quase me chegava a irritar por agradecerem tudo. Achava exagerado, quase um espirro que eu desse agradeciam (sim, agora exagerei), mas, constantemente agradecem.
Passando para o meu dia a dia, e até mesmo enquanto professora, acho que agradecemos pouco e em certos momentos não agradecemos por algo que nos fizeram (como que o que outro fez fizesse parte da sua obrigação) e nem damos valor ao que temos. Aqui, aprendi com as Irmãs a dar valor às pequenas coisas, pois, às grandes... todos agradecem!
A nível de oração, acho que nunca rezei tanto o terço como este ano :) tentava estar ao máximo presente nas orações com as Irmãs, algo que me foi proposto desde o momento em que entrei no Convento, e estando em discernimento vocacional fazia todo o sentido participar nas orações, pois é uma das formas de Deus se revelar/falar. Pela manhã, eram as laudes e missa – seguida de pequeno almoço com o Monsenhor João (já tenho saudades deste bom homem, pois para mim era o avozinho que me contava histórias e histórias de vida); depois à tarde, terço e vésperas e à noite, depois do recreio, completas.
O que é o recreio? É o momento do dia em que as Irmãs se reúnem, veem telejornal/futebol (se estiver a dar) e partilham o que fizeram durante o dia, como o mesmo lhes correu e como estão as Irmãs do “3ºAndar” (a preocupação com o outro).
Em determinados momentos, o recreio serviu para as Irmãs ajudarem com trabalhos para a Pastoral (quer a nível de catequeses quer para a pastoral do ensino superior), a cortar e dobrar material. Uma mão de obra boa e barata :) Quando não haviam trabalhos, haviam anedotas :) A vida é composta por tudo, até de grandes gargalhadas :)
Agora, que chega o momento de fazer o balanço e até de tomar consciência em que parte do Caminho me encontro, bem.... saí do Convento com muito mais do que deixei. Já disse e digo várias vezes, o estar no Convento (e acredito que para o género masculino seja o estar no Seminário) é algo muito desafiante, pois ficámos-nos a conhecer melhor e a chamar as coisas pelo nome, e em nós por vezes achamos que “eu não sou assim” e a verdade é que somos mesmo assim e ligeiramente um pouco pior, mas só ligeiramente :)
Desta Casa levo a atenção e o cuidado pelo outro; o ser agradecida e agradecer pela oportunidade que tive; a aprendizagem de em momentos de dor (falecimento de alguma Irmã), estarem todas unidas; em momentos de doença, todas se preocupam e quererem o bem da outra; “ó menina, bai comer....tu tens de comer não é só trabalhar”; “cuide de si, cuide de si”, e por incrível que pareça, foi o que mais me disseram antes de sair.
Contudo, apesar de ter estado no Convento, não me desliguei do mundo e fui estando atenta ao que se passava à minha volta, mas este “cuide de si”... tem que se lhe diga. Sim, em determinados momentos partilhei as minhas preocupações, e claro, as avozinhas tinham soluções bem simples para os meus "grandes" problemas :)
A partir daqui as coisas serão diferentes, pois a visão que tenho de mim mesma não é igual à de um ano a trás quando entrei no Convento.
A questão que muitos de vós estarão a colocar agora, acredito que seja: mas, vais ser freira? Não sei :) Como disse no início, compreender “as coisas” de Deus não é fácil. Neste momento, acho que não é por aqui o meu Caminho, acho que não é como religiosa que Deus me chama.
Ao que é que Deus me chama? Pois, o caminho faz-se caminhando :) a estrada é longa e tenho consciência que ainda tenho muito Caminho para percorrer. Ainda muitas lágrimas vou chorar; ainda muitas gargalhas vou dar até perceber a vontade de Deus para mim.
Neste ano que viveste no Convento, foste feliz? Sim fui feliz, pois estava rodeada por pessoas que me amavam, que me respeitavam, que me aceitaram com todas as minhas limitações e que compreendiam as minhas inquietações.
Ciente que “Nós só perdemos aquilo que não damos.” (p.125, O Tesouro Escondido, José Tolentino Mendonça), eu dei o melhor de mim mas......recebi muito mais do que o que dei.
Por tudo o que recebi, o meu profundo e sincero OBRIGADO!
O Caminho continua, e eu estou no Caminho como Peregrina que sou :)
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Natália Faria
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