Quando a minha liberdade prende os outros...

5 de Outubro de 1910 - A implantação da Republica em Portugal  

Hoje alguém me perguntava porque apareço com hábito algumas vezes e outras à secular, que significa vestida como o povo, confesso que respondi com o presente, com a liberdade que sinto em poder optar por aquilo que me facilita mais o apostolado! E na gratidão que sinto por ter essa liberdade, por "Cristo me ter liberdado para a Verdade/ liberdade". 

Isto é verdade, mas ao entrar no carro para regressar a casa, sozinha na viagem, recordei as vezes que, ao contrário do jovem que me questionou hoje, já me acusaram de heresias por estar de calças, ou as conversas da treta que já tive, com quem apenas quer uma Igreja feita para sua segurança, em que a diversidade seja banida, em que gestos e palavras estejam completamente sincronizados até por uma lingua desconhecida, mas comum...  Ou situações opostas, em que Irmãs minhas foram hostilizadas por estarem de hábito, confesso que em Portugal as abordagens que vivi são mais de brincadeira, ou de desejo, "Vocês deviam estar todas na forca" e o senhor segue a sua vida ou fica a gritar no passeio, enquanto eu sigo impávida, agradecendo a Deus o ano e século em que vivo.

Confesso que estas abordagens me dão uma pena profunda, Deus criou uma diversidade de cores, tons, sons, sabores, formas... Na Biblía, já no Antigo testamento, mostra-nos que escolhe pessoas tão diferentes, que tem um critério de seleção tão diferente do nosso... Também é verdade que estas pessoas, que insistem numa Igreja clerical, por vezes não gostam da Bíblia, que tem medo que lhe tire a fé, (confesso que estes argumentos para mim são incompreensíveis). Deus deu-nos a inteligência para criar, inventar... Há tanta coisa, tanta tecnologia fantástica e nós para além do pecado da omissão pela sorte do irmão, da destruição do mundo, da natureza, do outro, do nosso próprio eu ... Queremos uma Igreja à nossa semelhança... Limitada! 

Tudo isto também me fez pensar na data de hoje, no dia 5 de outubro fazemos memória de duas festas importantes na nação portuguesa, já o referimos, várias vezes neste blog, mas faz sentido lembrar: 

- 05 de Outubro de 1143: - Assinatura do Tratado de Zamora entre D. Afonso Henriques e o seu primo Afonso VI de Leão, pelo qual foi reconhecida a soberania ou independência do Reino de Portugal.

 - 05 de Outubro de 1910: - Proclamação da República em Portugal. Mas o facto que sempre esquecemos aconteceu há 110 anos e, quem esquece a história arrisca-se a que se repita, à sua frente, os mesmos erros, estou a falar da expulção das Ordens religiosas em Portugal!

Se em 1834 o decreto de extinção das Ordens Religiosas levou ao término das ordens masculinas, as femininas, por sua vez, agonizaram até à morte da última religiosa. Foi nesse ambiente hostil,  nessa época e num país sem Consagrados,  que Teresa de Saldanha fundou as Dominicanas, 2 apenas, após a formação na Irlanda, regressam a 13 de novembro de 1868, para o ensino, os pobres, a saúde e de uma forma muito concreta, a promoção da mulher... O decreto de Expulsão de 5 de Outubro de 1910 arrasa a obra da Madre Teresa de Saldanha, bem como outras Congregações que tinham surgido! Mais uma vez, o desejo de liberdade leva à destruição de obras, que só fizeram o bem, a expulsão do país de todas as religiosas estrangeiras e a debandada das portuguesas para as terras de origem. Contudo esta situação levou o país assumir a assumir a educação e várias obras que as religiosas tinham criado do nada para colmatar a pobreza, a ignorância e a miséria. Também o Espírito Santo é muito criativo e da expulsão surge a missão noutros países (na  Bélgica, no Brasil e nos Estados Unidos da América em 1911 e, em Espanha, em 1913). "Em Portugal as Irmãs continuaram discretamente a sua acção ao lado de Teresa, já idosa, [nos Cardais, em Lisboa, e em Braga, naquele que agora se chama Instituto Monsenhor Airosa] e também assumiram a orientação do Sanatório de Sant`Ana, na Parede"*, por imposição da sua Fundadora.

Se em 1868 e em 1910 as Irmãs tiveram de andar sem hábito, mas vestidas discretamente para poder "fazer o bem" a história ensina-nos que não é o hábito que faz o monge". È verdade que precisamos de sinais, mas na abundância da criação, a validade dos sinais não se pode regular por um indíviduo. Deus criou-nos À sua imagem e sememlhança, mas todos diferentes e livres para escolher o bem, mas com a opção de errar... A minha liberdade não pode atropelar a dignidade e liberdade do outro... Aliás não acredito que a liberdade alguma vez poderá ser imposta... 

Ir. Flávia Lourenço, op 

*http://www.dominicanas-scs.pt/congregacao/historia



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