Um ano de Albânia
Uma nova aventura carregada de desafios, oportunidades e aprendizagens. Acolhi esta nova missão como manifestação da vontade de Deus na minha vida, pois Ele sabe sempre o que é melhor para nós. Não houve muito tempo para pensar, pois até ao último momento estive envolvida em atividades. A última das quais o Dominismissio no Alandroal, onde no último dia se revelou a minha partida para a nova missão. Entre lágrimas e abraços fiz a minha despedida das atividades pastorais em Portugal. E depressa chegou o dia 4 de setembro onde fui enviada para o meu novo destino. As coisas de Deus são assim, marcam-nos. Fui enviada no aniversário da nossa fundadora e cheguei a Albânia no dia 5, dia de Santa Teresa de Calcutá, santa albanesa. As duas Teresas acompanham esta missão desde o início.
Albânia é o nome internacional deste país balcânico, que na verdade se chama Shqipëria, «o país das águias». É uma terra marcada por ocupações e sofrimento. Por 400 anos foi dominada pelo Império Otomano (Turquia), que despojou os cristãos da sua fé e do seu futuro. Em 1912, nasceu o estado albanês, mas na II Guerra Mundial foi ocupado pelo regime fascista italiano. Após o fim da guerra, por cerca de 50 anos foi refém da mais feroz e cruel das ditaduras comunistas da europa, que declarou o país como primeiro (e único) estado ateu do mundo em 1967. O regime procurou destruir todos os sinais de fé existentes e os cristãos viram como as suas igrejas eram destruídas e os seus sacerdotes executados. É uma terra de mártires, 38 destes foram beatificados em 2016. A queda do regime aconteceu em 1991 e com ela regressou a liberdade religiosa. Desde então, o país tem tentado reerguer-se a todos os níveis, mas o caminho ainda é muito longo. É considerado um dos países mais pobres da Europa.
Apesar de toda a perseguição religiosa, a fé mantem-se neste país e é um exemplo de convivência pacífica entre as diferentes religiões: muçulmanos, ortodoxos e católicos, que são a minoria. Contudo este tempo deixou marcas profundas na vivência da fé. Esta ainda é muito vivida no silêncio das casas, sem muitas manifestações públicas da mesma. Muitas famílias ainda não receberam os sacramentos, e por isso, a catequese catecumenal é o grande desafio. Muitos sabem quem é Jesus Cristo, mas não reconhecem a grandeza dos sacramentos e a importância de fazer parte da Igreja em comunidade.
A nível da sociedade o regime comunista também deixou as suas marcas. Os albaneses são um povo nobre que conserva as suas tradições, respeita os mais velhos e conserva a herança recebida. Mas durante o comunismo ateísta, o regime modificou a sua mentalidade ao ponto de não apreciarem o valor do comunitário, do voluntariado, da gratuidade e da verdade. Por isso, é árdua a tarefa de construir a Igreja como comunidade e despertar nos crentes o compromisso missionário.
Muitos perguntarão: mas vale a pena estar aí, se a vivência é tão pouca?! – É o Senhor quem dá a resposta no evangelho: onde dois ou três estiveram reunidos em meu nome, eu estarei no meio deles.
Aqui, a messe é grande e os trabalhadores são muito poucos. Na nossa diocese, a maior do país, os padres diocesanos, são apenas cinco, todos os outros são religiosos e não são mais de 30, divididos por 20 paróquias com vários lugares de culto. As congregações femininas são a presença maior da Igreja nesta diocese, espelho do país. Por isso, pedi ao Senhor da messe que mande operários para a messe.
Então e como te fazes entender?! – Só a nossa presença aqui fala mais do que qualquer palavra que eu diga. Experimentei isso de uma forma muito bonita. Naturalmente, também frequentei as aulas de shqip (albanês), onde nos encontramos vários missionários católicos chegados na mesma altura para o desafio da missão nesta terra. E esses são os sinais que Deus nos dá, que permanece sempre connosco. Vindos de Portugal (eu), Itália (4), Perú (1), Timor-Leste (1) descobrimos que havíamos chegado ao mesmo tempo na Albânia e que a linguagem do Evangelho fala mais alto. Caminhámos juntos, fomos partilhando as nossas dificuldades, mas sobretudo percebendo que Deus fala através de nós, apesar de no início não conseguimos falar muito mais do que Falemimderit (obrigado), Mirëmëngjes (Bom dia), Mirëdita (Boa tarde), Mirëmbrëma (Boa noite), Mirupafshim (Adeus), Po (sim), Jo (não), Si je? (Como estás?). A nossa missão aqui é sermos uma pequena luz no mundo, a pequena porção de fermento na massa. Podemos não fazer muito, mas importa que nos doemos totalmente.
Aqui na Albânia, compreendi que mais do que fazer importa ser. Esta palavra me tinha acompanhado desde o dia que recebi a notícia da minha mudança. Agora era preciso ser Maria e não Marta. Fiz esta experiência por diferentes vezes…. A primeira foi sem dúvida a que mais me marcou…. Um mês depois de ter chegado, andávamos no centro de Tirana a tratar dos documentos necessários para o visto, e ao passar por várias pessoas que conversavam, um homem de meia-idade a nossa passagem faz o sinal da cruz sobre si mesmo e diz: “Qoftë leveduar Jezus Krishti” (Louvado seja Jesus). Aquele gesto tão simples e tão profundo marcou-me. Aí tive consciência, que mais do que falar importa ser, porque só a nossa presença é sinal de Deus no meio do povo. Escutar esta saudação tornou-se habitual também quando entrava no autocarro para as aulas e em muitos outros sítios. É a saudação dos católicos. E se no início respondia em português com o passar dos meses aprendi a responder em albanês e a também eu a saudar os outros desta forma. “Qoftë levduar Jezus Kristi, përgjithmonë jetes!” (Louvado seja Jesus, para sempre seja louvado!)
Os sinais que acompanham esta missão, e que me fazem perceber que é aqui que Deus me quer e que me fazem sentir em casa são muitos.
Logo em primeiro lugar, a grande devoção a Santo António, que à sua volta reúne todos os crentes das diferentes religiões. Não há igreja que não tenha uma imagem do santo português, e que tem devoção especial nas 13 terças-feiras que antecedem o dia 13 de junho. Estes são dias de jejum, onde não se come nada de origem animal.
Um outro sinal descoberto num dia de retiro no mês de fevereiro, na véspera da festa dos Pastorinhos, foi encontrar o mosteiro de São José, em Arameras, que tem como co-padroeira Santa Jacinta Marto. Ali descobri um painel de azulejos vindos de Fátima e uma pintura dando o nome ao parque infantil de Santa Jacinta. Uma outra manifestação aconteceu também em dias de retiro, desta vez em Agosto, quando passamos uma semana numa outra comunidade de irmãs, em Velipoje, e que na sua entrada tinham a imagem de Nossa Senhora de Fátima a saudar-nos.
Sinal são também as pessoas que Deus nos coloca no caminho, além das minhas manas da comunidade, e que me ajudam a minimizar as dificuldades. O frei Constantino, OP, que foi missionário por mais de 20 anos no Brasil, pelo que fala português e me possibilita receber o sacramento da reconciliação na minha própria língua. O mesmo sucede com o Pe. Lauri, missionário redentorista espanhol, nesta missão há 6 anos na Paróquia hi de Kamëz, e a quem roubei algumas linhas para este texto e que com as suas partilhas me anima na missão.
Estes são apenas alguns dos sinais que me dão a certeza que Deus prepara o meu caminho e me mima para que eu saiba que também aqui é agora a minha casa. E é assim que me sinto: em casa!
Se já consigo falar muito?! Na verdade não, mas ainda assim sei que Deus precisa de mim aqui. Porque mais do que fazer, importa ser!
Ir. Ana Margarida Lucas, op
Importa ser e tu és tanto! Beijinho e abraço apertado, mana do meu ❤️. Obrigada pelo teu testemunho 😘
ResponderEliminarObrigada, querida mana!!! Muitos beijinhos e ainda vós espero aqui um dia! 😉
EliminarEste comentário foi removido pelo autor.
EliminarVerdade irmã Ana, importa somente ser!
ResponderEliminarFoi com muita atenção que li as suas palavras e sei e acredito que o Senhor a enviou para aí porque era aí que ía ser feliz, pois todas as obras são feitas pelos seus eleitos.
Que Ele a continue a escolher para a sua messe porque é uma boa escolha.
Bjs da família Matos de Estremoz.
Muito obrigada! Sou um simples instrumento nas mãos de Deus. Beijinhos
EliminarBonitas palavras Ir. Ana :-) Uma boa missão. Beijinhos, Carla Taveira
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