Quinta-feira Santa: Pão vinho e humildade

Hoje é um dia  duplamente especial, confesso que só entendi o sentido pleno do Tríduo, que começa na tarde de hoje, quando comecei a participar no tríduo no convento! Até aí vivía-o como um dia mais intenso de penitência e caminhada Quaresmal! Sendo de uma vila, longe da Catedral acho que só uma vez tinha assistido à missa crismal, porque fomos com o grupo de jovens à "cidade" e não captei a sua dimensão espiritual.

Da missa Crimal, Ev Lc 4, 16-21, uso as palavras, do D. António Couto, Bispo:

«O Espírito do Senhor sobre mim, porque o Senhor me ungiu» constitui, de facto, a maneira mais bela e profunda de o presbitério de uma Diocese poder afirmar em uníssono a sua identidade diaconal, e não patronal. É mesmo a única maneira de nós podermos dizer quem verdadeiramente somos. Algumas formas verbais que podemos pedir outra vez emprestadas a Isaías e a Jesus podem ajudar-nos a perceber melhor a grandeza e a dignidade da nossa vocação e missão: ungidos e enviados para anunciar o Evangelho aos pobres.”

Já ouvi cristãos dizerem que era uma missa para os padres e as freiras, por isso deixo aos leigos a mensagem do Bispo de Lamego: “Mas também vós, Fiéis Leigos, batizados e crismados, sois, na verdade inteira, outros Cristos, porque fostes também Ungidos com o óleo do Crisma, que recebe o seu nome de Cristo. Cristo significa Ungido. Crisma significa Unção. Também vós, amados Fiéis Leigos, fostes Ungidos na fronte, no Batismo e na Confirmação, com o óleo do Crisma.”[1]

Hoje é um dia em que somos chamados a rezar de uma forma especial pelos sacerdotes, é o dia deles, da Instituição da Eucaristia. E colocando no Sacramento da Ordem a tónica de serviço, que Jesus lhe incutiu no início, temos o lava-pés! Celebração de que sempre gostei muito. Contudo este ano, devido às medida de prevenção contra o Covid 19, não se efetua este gesto tão profundo de o Bispo lavar os pés a 12 pessoas. Mas deixamos uma reflexão de Santo Agostinho:

“Lava sempre os nossos pés, Aquele que sempre intercede por nós; e todos os dias precisamos lavar os pés, ou seja, direcionar nossos passos no caminho da salvação.”

“Tendo começado a lavar os pés dos discípulos, o Senhor aproximou-se de Simão Pedro, o qual Lhe disse: Senhor, vais lavar-me os pés? (Jo 13,6). Quem não teria medo de ver o Filho de Deus lavar seus pés? Embora seja um sinal de ousadia temerária do servo contradizer o Senhor, de o Homem se opor a Deus, Pedro preferiu isso a deixar que seu Senhor e Deus lavasse seus pés. (...)Jesus quis baptizar os discípulos, começando pelo Pedro. Pedrou engasgou, como qualquer outro discípulo lhe teria faltado o ar perante isto, e disse: Senhor, Tu vais lavar meus pés? Tu? A mim? É melhor meditar do que tentar explicar essas palavras, por medo de que a linguagem não consiga expressar o que a alma conseguiu conceber.

Mas Jesus responde, e disse-lhe: O que eu faço, não entendes agora; entenderás mais tarde. E, no entanto, consternado com a altura daquele gesto do Senhor, Pedro não permite o que ainda não entende a razão: ainda não aceita, ainda não tolera que Cristo se humilhe a seus pés. Não lavarás meus pés - diz ele - jamais. O que significa jamais? Significa: eu nunca vou aceitar, nunca vou tolerar, nunca vou permitir tal coisa. Então o Salvador vence a relutância do doente assustando-o com o perigo que corre a sua saúde. Ele responde: Se Eu não te lavar, não terás parte comigo. Disse-lhe: Se Eu não te lavar, mesmo que seja só os teus pés; como é costume dizer: "tu me pisaste", quando só nos pisam o pé.

Mas Pedro dividido entre o amor e o temor, assustado mais com a ideia de perder Cristo do que com vê-Lo humilhado aos seus pés; Senhor - disse ele - não só os pés, mas também as mãos e a cabeça! (Jo 13,7-9). Ou seja, em face dessa ameaça, dou-lhe todos os meus membros para lavar; não apenas não removo membros mais os inferiores de Ti, mas também apresento-Te os membros superiores. Enquanto Tu não me recusares a ter parte contigo, eu não recuso nenhuma parte do meu corpo que Tu ó Deus queiras lavar.”[2]

Que o branco da toalha, que prepara a mesa para a ceia mais importante do mundo, aquela em que o manjar é o próprio Deus; mas também a toalha, que seca os pés, a toalha da humildade, do amor louco do Deus que encarnou, nos leve à reflexão, contemplação e entrega! Uma boa quinta-feira Santa!

Ir. Flávia Lourenço, op e Ir. Arta Leka, op

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[1] In https://mesadepalavras.wordpress.com/; D. António Couto

[2] https://www.augustinus.it/italiano/commento_vsg/omelia_056.htm; Tradução e adaptação, Ir. Arta Leka 


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