ENTRE TANTOS - "Então, novidades?"
Qualquer boa conversa, sobretudo com pessoas com quem já não
falamos há muito tempo, seja pessoalmente ou não, começa com este típico diálogo:
1: Olá! Tudo bem?
2: Sim e tu? Como estás?
1: Também estou bem! Então, novidades?
Quem se revê? Muitos, bem sei! Queremos sempre saber das
novidades primeiro para dar tema às nossas conversas e então, depois disso, lá
começamos a divagar, a divagar e a divagar em conversas sem fim!
No outro dia, ao falar por vídeo chamada com uma amiga, apercebemo-nos
que, visto estarmos as duas a cumprir o nosso dever de isolamento social, as
novidades iam começar a escassear para alimentar a nossa amena cavaqueira… Aquilo
meio que nos assustou, confesso, mas rapidamente (e como sempre) levámos a
coisa para a brincadeira e a chamada continuou no mesmo tom de cumplicidade ridícula
que nos é tão própria.
Mas deixou-me a pensar. Basta olhar para os telejornais. As
notícias são inteiramente dedicadas à Covid-19 porque sim, é uma pandemia à escala
global de enorme gravidade, que nos gerou a todos um clima de instabilidade, medo
e desolação perante os números atualizados que nos chegam diariamente dos mais
diversos meios. Essa pandemia que faz trabalhar tantos até à exaustão em prol
da nossa sociedade mas que também fez parar muitos outros… Já não há notícias de
comícios de partidos, nem de jogos de futebol, nem tão pouco de grandes
festivais de música… o Covid-19 monopolizou os media, que têm de preencher
uma hora e pouco de telejornal ininterruptamente, passando agora de notícias
bastante generalistas para coisas aprofundadas, passando do âmbito
(inter)nacional até para o âmbito local. Lá fazem uma peça sobre o lar daquela
freguesia do interior que nunca ouvimos falar, lá fazem outra peça sobre um
atelier de costureiras que têm feito máscaras para doar. Essas pequenas grandes
notícias ganham valor, esse valor imenso que têm, mas que só apareceriam quando
muito no rodapé do “Portugal em direto” das 18h na RTP1, bem antes do “Preço
Certo”, na hora em que ainda ninguém chegou ainda em casa, depois de um dia de trabalho
e pouco se importa em ligar a TV.
Talvez seja este tempo ocasião para isso mesmo também. Para falarmos
de coisas nunca faladas, sem forçar, com os nossos amigos e descobrirmos
imensas novidades que, apesar de anos de amizade em alguns casos, nunca tinham
sido partilhadas. Para contar que até aprendemos a tocar uma música nova na
guitarra agora que temos um bocadinho de mais tempo, uma música que ouvimos
recentemente pela primeira vez e perceber que o nosso amigo é fã dessa banda e
que nunca me tinha contado. Para contar que vou organizar um lanche especial para
família, com crepes, e receber a melhor dica, sem nunca termos imaginado que o
nosso amigo era um autêntico chef no que toca a fazê-los. Para contar
que já não suportas o teu cabelo que já está grande e ela até te dizer que ficavas bem com a franja que naturalmente apareceu, coisa que nunca tinhas ponderado e agora até te parece uma boa ideia. Agora quando nos
perguntarem por novidades não teremos grandes viagens nem grandes eventos para
relatar, com fotografias para mostrar, nem sequer as chatices do trabalho que
nos aborrecem: teremos pequenos apontamentos do quotidiano que falarão tanto ou
mais de nós aos nossos, em que tudo é importante e relevante desde que nos
mantenha ligados e unidos.
Uma semana mágica se aproxima, começando já no Domingo de
Ramos: a semana Santa. Essa semana que, por mais anos que passem, nos surpreende
pois a paixão, morte e ressurreição de Jesus é sempre novidade na nossa vida. A
cada ano, toca-nos de forma sempre única, irrompendo no meio da nossa vida com detalhes
nunca captados, pormenores que pela primeira vez nos fazem refletir diferente, instantes
que significam mais do que esperávamos. A Páscoa é sempre a eterna novidade
pois podemos sempre celebrá-la como na primeira vez, maravilhados diante da
face deste Deus tão humano que tanto sofreu para nos mostrar que podemos tocar
o divino e, Nele, sempre viver.
Ana Emanuel Nunes
Comentários
Enviar um comentário